Na contramão da obesidade, seguradoras podem apostar na prevenção e incentivar bons hábitos

Dados sobre a obesidade no Brasil
Uma pesquisa apresentada no Congresso Internacional sobre Obesidade (ICO 2024) revelou que, se as tendências atuais continuarem, até 2044 cerca de 75% dos adultos brasileiros estarão acima do peso. Hoje, esse índice já atinge 56% da população adulta. O estudo, liderado por Eduardo Nilson, da Fiocruz Brasília, destacou ainda que a obesidade quase dobrou no Brasil entre 2006 e 2019. Até 2030, estima-se que 68,1% dos brasileiros estarão com sobrepeso ou obesidade, com maior prevalência entre mulheres, negros e outros grupos minorizados. O crescimento da obesidade também levou a um aumento no número de cirurgias bariátricas. Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), entre 2020 e 2024 foram mais de 290 mil procedimentos no país, a maioria foi realizada por planos de saúde (260 mil), seguidos por 31 mil procedimentos via SUS. Esses dados deixam claro que o avanço da obesidade impõe desafios aos sistemas de saúde e também para as seguradoras e operadoras de saúde. Por isso, é importante adotar estratégias preventivas, incentivar hábitos saudáveis e trabalhar junto a políticas públicas para conter essa tendência e frear o aumento dos casos.
Desigualdades, tratamentos caros e insegurança alimentar
O programa Profissão Repórter, exibido em 4 de junho, abordou os impactos do excesso de peso na vida de adultos e crianças, além do uso de medicamentos para emagrecimento e os dilemas enfrentados por quem opta pela cirurgia bariátrica. Além disso, apontou que o tratamento pelo SUS é limitado, com baixa disponibilidade de equipes multidisciplinares, longas filas de espera e poucas vagas para procedimentos cirúrgicos. A reportagem indicou que a obesidade também é resultado de um contexto de insegurança alimentar vivenciado por muitos brasileiros, já que boa parte da população consome, por necessidade, alimentos ultraprocessados por serem, muitas vezes, mais baratos, porém altamente prejudiciais à saúde. O enfrentamento da obesidade requer esforços integrados entre saúde pública, políticas sociais e iniciativa privada, com serviços de saúde que garantam o acesso a tratamentos eficazes.
Ozempic provoca ‘efeito sanfona’ e os perigos do uso indiscriminado
Uma meta-análise publicada na revista BMC Medicine, com base em dados de 11 estudos e 2.466 pacientes, revelou que a interrupção do uso de medicamentos como o Ozempic resulta na recuperação do peso entre 8 e 20 semanas, muitas vezes ultrapassando o peso inicial. O estudo aponta que esse efeito é uma resposta fisiológica do corpo, que interpreta a perda de gordura como ameaça e ativa mecanismos para restaurar suas reservas de energia. Segundo Cynthia Valério, da Abeso, esse “efeito rebote” pode comprometer a saúde, especialmente quando há perda de massa muscular e retorno a um peso ainda maior. O Ozempic, embora eficaz em alguns casos, não representa solução definitiva contra a obesidade e a dependência do remédio para o emagrecimento tem preocupado profissionais de saúde. Além disso, o uso indiscriminado pode elevar os custos assistenciais e gerar impacto nos planos de saúde. Especialistas reforçam que a eficácia do tratamento depende de um plano completo, que inclua dieta, exercícios, acompanhamento médico e manutenção de longo prazo.
O que está (e o que não está) na alçada dos planos de saúde?
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que planos de saúde não são obrigados a cobrir tratamentos para obesidade mórbida em clínicas particulares escolhidas pelo paciente, desde que haja atendimento disponível na rede credenciada. O caso envolveu uma jovem com obesidade grau 3 e comorbidades, que buscava custeio de um programa intensivo fora da rede. A situação reforça os limites contratuais dos planos, mas também abre espaço para discutir como as operadoras podem utilizar coberturas existentes, adicionando iniciativas que beneficiem esses pacientes e ofereçam o cuidado necessário. O setor de seguros pode agir de forma mais intervencionista, promovendo saúde por meio de programas de prevenção e suporte contínuo aos pacientes com obesidade. Essa abordagem pode gerar impactos positivos tanto na qualidade de vida quanto na redução de custos a longo prazo.
Seguro de vida e saúde como aliados da prevenção
Felizmente, há um movimento de enfrentamento dentro do setor segurador. Algumas seguradoras já oferecem compensações financeiras por bons hábitos de saúde, como prática de exercícios, alimentação balanceada e check-ups regulares. O objetivo é estimular e melhorar a qualidade de vida dos segurados, reduzindo riscos de doenças como obesidade, diabetes e hipertensão. A Bradesco Saúde, por exemplo, passou a integrar programas de acompanhamento e orientação com base em dados dos próprios segurados. Entre outras iniciativas da seguradora que visam o cuidado com a saúde, destacam-se o Programa de Orientação Nutricional, que oferece suporte em desintoxicação, metabolismo e alimentação; e o Meu Doutor, que proporciona atendimento contínuo e personalizado com médicos que acompanham o histórico de saúde do paciente, garantindo maior eficiência no cuidado.
A responsabilidade do setor diante de um cenário crítico
O avanço alarmante da obesidade no Brasil exige uma mudança estrutural na forma como se enxerga a saúde. Além da questão médica, a obesidade está intimamente ligada à insegurança alimentar. O consumo de alimentos ultraprocessados, mais baratos e acessíveis, contribui para a má alimentação da população. Isso reforça a importância de programas que promovam educação nutricional e mudanças de comportamento, inclusive dentro das seguradoras. Com tecnologias avançadas, uso de dados e parcerias com profissionais de saúde, o setor pode ajudar a construir soluções mais eficazes especialmente para os clientes em maior vulnerabilidade, premiando bons hábitos, monitorando riscos com inteligência de dados e atuando junto a iniciativas públicas. Como produto dessas ações, as companhias podem reduzir custos e contribuir para a redução de um problema que cresce em ritmo alarmante.